Weber Andrade
A grande questão depois que os celulares se tornaram populares é: onde foram parar os orelhões? Foram removidos? Jogados no lixo? Abduzidos por alienígenas?
Na semana passada, estivemos em Mantena (MG) e, ao fotografarmos a praça da Matriz, para uma reportagem, nos surpreendemos com uma peça praticamente em desuso em todo o país, o popular Orelhão, telefone público coberto por uma proteção que se parece mesmo com uma grande orelha.
Há cerca de três anos, fizemos reportagem sobre esses aparelhos e suas condições em Barra de São Francisco. Na antiga sede da Telest, hoje, se não me engano pertencente à Vivo, muitas dessas ‘orelhas’ jaziam nos fundos do prédio, esperando, com certeza, a hora de serem levadas para o lixo.
Na cidade, poucos telefones públicos funcionavam e já não havia quase nenhum orelhão. No centro da cidade, no final dos anos 1990, o então prefeito José Honório Machado mandou construir algumas cabines telefônicas, que substituíram os orelhões para proteger os aparelhos telefônicos e os usuários da chuva e do sol. Pelo menos três delas ainda existem e, pasmem, uma ainda tem o aparelho em funcionamento.
Na porta do Pronto Socorro do Hospital Estadual Dr. Alceu Melgaço Filho (HDAMF), ainda sobrevive outro telefone público, protegido pela grande orelha azul e que também ainda funciona. No mais, os aparelhos que ainda existem pela cidade – encontramos um no antigo Colégio Santa Terezinha, agora sede de uma escola em tempo integral e outro na rodoviária, ambos totalmente mudos.
Desde 2019, a instalação e manutenção dos telefones públicos, os populares orelhões, não é mais obrigatória em localidades com mais de 300 habitantes. Nestes locais, os orelhões deveriam ser mantidos, obrigatoriamente.
O Espírito Santo, segundos dados da Anatel, tinha 3.535 orelhões disponíveis e em manutenção 238 (disponibilidade de 93,69%) até 2018. Segundo a Anatel, não podem ser retirados os orelhões já instalados nas localidades com até 300 habitantes. Já nas localidades com mais de 300 habitantes, as concessionárias devem ativar e manter orelhões para atender os estabelecimentos de ensino regular, estabelecimentos de saúde, estabelecimentos de segurança pública, bibliotecas e museus públicos, órgãos do Poder Judiciário, órgãos do Poder Executivo e Legislativo, órgãos do Ministério Público e órgãos de defesa do consumidor, terminais rodoviários, aeródromos e áreas comerciais de significativa circulação de pessoa. Caso algum destes estabelecimentos acima indicados não tenha orelhão instalado, mediante solicitação, a concessionária responsável deverá providenciar a sua instalação.
Mas, ter um aparelho celular se tornou tão comum que, hoje em dia, quase ninguém se lembra deles. Mas, se acontece algum imprevisto e você precisar de um telefone público, o que fazer?
Se até Bruno e Marrone já tiveram que ligar de um orelhão para avisar a pessoa amada que estava esperando, um dia pode chegar a sua vez.
Cartões viraram febre
No entanto, hoje, só é possível usar o telefone público para fazer chamadas a cobrar. A menos, claro, que você tenha guardado um daqueles cartões que substituíram as fichas, na década de 1990 e tornaram-se febre, com muitos colecionadores. Resistiram até meados da década passada.
Em 2014, a antiga Telemar Norte Leste, já convertida em Oi, era a patrocinadora oficial da Copa do Mundo da FIFA e lançou uma das mais cobiçadas séries, com cinco cartões de orelhão colecionáveis para celebrar o mundial.
Foram produzidas duzentas mil unidades ao todo, distribuídas em toda a área de atuação da operadora. Dois modelos com imagens do Fuleco, o mascote daquela edição da competição, e outros três com curiosidades sobre a história do torneio.
Séries como aquela atraíram a atenção dos colecionadores de cartões telefônicos de orelhão, chamados de telecartofilistas. Esse mercado movimentava pessoas que mantêm arquivos com exemplares comemorativos, relacionados a datas marcantes, ou edições raras. Em sites de comércio eletrônico, colecionadores chegavam a anunciar cartões por R$ 1 mil e coleções completas eram oferecidas por mais de R$ 20 mil.
Provavelmente, ainda há quem tenha guardada a sua coleção de cartões de orelhão.
Como usar um telefone público?
Os orelhões estão tão em desuso que muitas pessoas nem sabem como utilizar o aparelho. Como explicamos acima, não há mais cartões à venda e a forma mais prática para fazer chamadas em casos de emergência é fazendo uma ligação a cobrar. Para isso, você deve proceder da mesma maneira que uma ligação a cobrar feita do celular ou telefone fixo: Disque 9090 + número de telefone desejado.
Se você não tem o costume de fazer ligações a cobrar, saiba que uma musiquinha vai tocar quando a pessoa atender. Logo depois disso, você já pode falar normalmente.
Como ligar a cobrar para outra cidade de um orelhão?
Para ligar para outras cidades a cobrar de um telefone público, você deve seguir a mesma regra das ligações comuns.
Então, basta escolher a operadora que você prefere e discar: 90 + código da operadora + DDD + número de telefone desejado.
Como fazer uma chamada a cobrar para outro país?
Se, no seu caso, a pessoa com quem você precisa falar está em outro país, ainda assim esses equipamentos podem ser a sua salvação.
Preste atenção na ordem que você deve seguir: 00 + código da operadora + código do país + código da cidade + número de telefone desejado.
É possível fazer ligações para fixo gratuitamente?
Até março de 2018, alguns Estados do Brasil disponibilizaram as chamadas gratuitas para fixo a partir de telefones públicos, incluindo ligações de longa distância. Infelizmente, não há previsão para que esse tipo de serviço volte a ser de graça até então. Por isso, não fique dependendo dos telefones públicos.
Medidas alternativas
Tendo em vista o desuso e o descaso com os telefones públicos do Brasil, o setor regulatório discutiu junto a Anatel a possibilidade de modernizar os orelhões para que voltem a ser necessários para as pessoas.
Com isso, em Florianópolis, foi lançado o primeiro (e único) telefone público com Wi-Fi! Porém, ainda não se teve notícias se o recurso foi eficiente ou utilizado. O fato é que o serviço não foi expandido para outras regiões, possivelmente pelo alto custo e os casos de má preservação dos telefones públicos.
Como surgiu o orelhão?
O orelhão foi criado em 1971 pela arquiteta brasileira Chu Ming Silveira, quando foi chefe do Departamento de Projetos da Companhia Telefônica Brasileira. Chu recebeu a missão de criar um protetor para os telefones públicos que fosse bonito e funcional.
Sendo assim, a arquiteta pensou que a partir do formato de um ovo, a acústica seria melhor mesmo em ambientes fechados (Bruno e Marrone confirmaram que para usar um orelhão era sempre “um barulho, uma confusão”).
Então, o projeto ganhou vida e foi fabricado em fibra de vidro, já que este é um material resistente tanto ao sol quanto à chuva, assim como às oscilações de temperatura comuns no Brasil. No entanto, o orelhão não chegou com esse nome.
Denominados de Chu I e Chu II, a população acabou criando apelidos para os dois primeiros projetos: orelhinha e orelhão. Por muito tempo, os telefones públicos eram o único meio de comunicação que as pessoas tinham para falar com alguém fora de casa. Se você nasceu já com o celular na mão, isso pode ser um choque.
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