Até poucos anos atrás, a administração municipal em Barra de São Francisco era elogiada por servir refeições a baixo custo, em um projeto que ficou conhecido como Marmitão e que servia, quando foi extinto, refeições (almoço) a R$ 3,00. Era uma espécie de imitação do projeto de Restaurante Popular, implantado pelo Partido dos Trabalhadores e que, no início, servia refeições e marmitex a R$ 1,00.
Na gestão anterior, do professor Alencar Marim, eleito pelo PT, não houve projetos desse tipo em Barra de São Francisco, não obstante a distribuição regular de alimentos não processados, via programas em parceria com os governos estadual e federal.
Alencar justifica a falta de programas mais ousados pelo endividamento herdado da gestão anterior, de Luciano Pereira, que extinguiu o projeto Marmitão.
“Nossa gestão foi direcionada para o equacionamento da absurda dívida municipal que herdamos em todos os setores, pela necessidade de regularização da dívida previdenciária e outras que engessavam tudo. Deixamos de fazer festa, de investir em muitas coisas para conseguir retomar a capacidade administrativa do município, não para nós mesmos, mas para quem viesse a assumir o governo”, explica o professor.
Marim chegou a enfrentar o primeiro ano da pandemia da Covid-19, quando os casos se multiplicavam de forma absurda, mas entregou a Prefeitura para o seu sucessor, Enivaldo dos Anjos, “saneada e com dinheiro, bastante dinheiro em caixa”, afirma ele.
Enivaldo dos Anjos, um político experiente que inovou muito em sua primeira gestão, no final da década de 80 e início dos anos 90, foi deputado cinco vezes, conselheiro do Tribunal de Contas (TCE-ES) por dez anos e retornou ao poder no municipal no auge da pandemia.
Viu o número de casos e de mortes por Covid-19 se multiplicar a ponto de o veículo de propaganda volante que anuncia os óbitos na cidade ter que circular mais de uma vez por dia, anunciando mortes e sepultamentos sem velórios.
Nesse período, não obstante a “ajuda” que o Governo Federal pagava aos mais necessitados e vários que nem mesmo precisavam do auxílio emergencial, a fome passou a ameaçar a integridade física e mental de uma grande parcela da população francisquense, que tem mais de 3 mil famílias em situação de pobreza e, sem aulas nas escolas, não tinham sequer como alimentar direito os filhos.
Centro de Apoio Alimentar
Foi então que o prefeito Enivaldo dos Anjos tomou uma decisão corajosa e sensível, até hoje criticada por alguns “abastados” da cidade, que consideram “absurdo” dar comida de graça com o dinheiro dos impostos.
Em 29 de março de 2021, o prefeito criou o primeiro projeto, o Centro de Apoio Alimentar Jesuína Destefani, implantado em um galpão estrategicamente localizado na subida do bairro Colina, um dos mais carentes da cidade.
Jesuína Destefani era uma incansável apoiadora de projetos sociais da Igreja Católica e morreu vencida pela Covid-19. Mas o projeto também tem lastro nos evangélicos, já que o referido galpão pertence à Primeira Igreja Presbiteriana de Barra de São Francisco, que cedeu o espaço graciosamente.
Assim que as refeições começaram a ser servidas, filas imensas passaram a ocorrer na porta do CAA Jesuína Destefani.
“Eu tenho quatro filhos, três meninas e um menino, a mais velha, hoje, com 11 anos e não sei o que seria de nós se não fosse por esse projeto”, conta C. G. A., 30 anos, moradora do bairro Colina.
“Não tinha mais a merenda da escola, meu marido estava preso e eu não podia trabalhar e deixar as crianças sozinhas. Hoje, a gente não precisa mais ir lá para se alimentar, mas, graças a Deus, o projeto continua e tem muito gente aqui no bairro que ainda depende dele”, comenta C.G.A.
No final da semana passada, a coordenação do CAA Jesuína Destefani informou que o projeto, que hoje só fornece alimentação no próprio local, onde todos podem comer à vontade, atingiu a marca de 236,8 mil refeições servidas em um ano e 4 meses de funcionamento, ou seja, 14,8 mil refeições por mês e 493 por dia, em média. No início o projeto chegou a servir mais de 800 marmitex em um dia.
Refeição Amiga
Mas, a situação econômica ruim do país e o fim do auxílio emergencial, continuaram a provocar insegurança alimentar nos francisquenses mesmo com a volta às aulas, este ano.
Em outra decisão corajosa e contrariando os críticos, Enivaldo dos Anjos foi além: Criou o Programa Refeição Amiga, no bairro Irmãos Fernandes, onde é servido um sopão, todos os dias úteis da semana, por volta das 18h.
O Programa Refeição Amiga, criado em maio deste ano, já serviu nada menos do 17.650 refeições até o final do mês passado, ou seja, em pouco mais de 70 dias, o que dá média de 70 refeições por dia. “Eu venho aqui tomar a sopa todos os dias, é uma mão na roda. Saio lá do bairro Cruzeiro e, se pudesse, levava um pouco pra casa, mas do jeito que está ajuda muito. Eu também almoço lá em cima (no CAA Jesuína Destafani), pois não tenho bolsa família nem aposentadoria, só com a caridade do prefeito é que vou vivendo”, relata J. C.G, 62 anos.
Assim, no fechamento do mês passado, os dois programas, CAA Jesuína Destefani e o Refeição Amiga serviram juntos, mais de 255 mil refeições, média de 15.937 por mês e 531 por dia.
Hortões produzem 788 kg de legumes e 189 caixas de verduras em julho
Hortão Municipal
Os programas de alimentação são amparados em doações da sociedade, recursos municipais e também em produção própria de verduras, legumes e frutas, tudo sem agrotóxico.
No balanço do mês passado, os dois hortões atingiram a marca de 5.188 quilos de legumes, tubérculos e frutas e mais de 560 caixas de folhas e cheiro verde (temperos), tudo entregue nos centros alimentares, nos bairros mais carentes e nos projetos sociais do município.
“Está tudo interligado”, observa Enivaldo dos Anjos, salientando que os hortões, além de fornecer alimentos saudáveis a custo muito baixo, ainda trata de recuperar pessoas em situação de rua. “Já temos pelo menos oito pessoas que viviam e dormiam nas ruas, pedindo esmolas, bebendo e brigando, que trabalham lá no hortão do Polo Industrial, recebem uma ajuda de custo de cerca de R$ 400 e três deles já estão trabalhando na Prefeitura, recebendo salário mínimo”, destaca.
“A fome é a pior doença que existe”
No final da semana passada, em entrevista à FM dos Anjos (87,0) o prefeito Enivaldo dos Anjos falou dos programas sociais de seu governo e disse que ‘a fome é a pior doença que existe’.
“Eu recebo críticas, inclusive de gente abastada, gente que tem dinheiro e já veio me pedir favor, para interceder por uma cirurgia cara, mas pessoa que pode pagar. Tem um proprietário rural que vive nos criticando nas redes sociais, mas eu não governo apenas para os ricos e sim para toda a sociedade e, principalmente para aqueles que mais precisam”, assegura.
“Muita gente fala: ‘Eu acredito em Deus’, mas quando vê um mendigo na sua porta, liga pra polícia para mandar retirar”.
“Penso que Deus está em todos os lugares, sabe de todas as coisas. O mundo aderiu à questão material como sua principal base de sustentação e orgulho, mas quanto vale a solidariedade, a espiritualidade?”
“Muitas pessoas só pensam no dinheiro, na própria família, mas não deveria ser assim, porque ninguém é melhor do que ninguém. Todos somos iguais e todos vamos para o mesmo lugar, pode ser bilionário, pode ser o Bill Gates, que vai ter câncer, vai ficar doente e, mesmo se não adoecer, vai chegar uma hora em que vai morrer”, afirmou.
E emenda: “Quando a administração toma a decisão de prestar um serviço como esse, não estamos fazendo favor nenhum. Isso aqui é uma mão estendida e a Prefeitura é obrigada a fazer isso, o prefeito não está fazendo vantagem nenhuma. Servir é obrigação, nós, prefeito e vereadores, somos pagos para fazer isso” analisa.
E encerra: “Administração não é só asfalto, calçamento, festa, futebol. Comida é saúde, quando você cuida das pessoas, quando você alimenta as pessoas que precisam, você evita a pior doença, que é a fome, nós gestores temos a obrigação de ser justos, de ajudar ao próximo.”
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