Weber Andrade*
As histórias de onça vivem rendendo boas crônicas para este escritor bissexto. Há pouco tempo, escrevemos sobre uma que teria comido um bezerro na propriedade rural do meu amigo Janildo Rocha, o Quarenta, empresário que vende sorte em bilhetes, mas também cultiva peixes, cria gado e amizades por todo o lado, com sua prosa fácil.
Esta semana, fui ter à loteria dele no centro, no meio da tarde, em busca de socorro para um pequeno problema, e coincidiu de o gajo estar me ligando naquele momento, para ajudá-lo em uma tarefa importante. E lá fomos nós, em direção ao córrego São Paulo, onde fica o sítio dos tambaquis ariscos e da fartura de frutas.
No caminho, claro, passamos por alguns locais onde a prosa se esticava com aqueles ‘alemães’ sorridentes da beira da ES-080 que adoram contar causos – de onça, então, nem se fala – e os assuntos iam fluindo, em meio a gargalhadas terapêuticas.
Como não podia deixar de ser, o assunto futebol brotou na conversa, com os amigos acuando o Quarenta, vascaíno de boa cepa, sofredor nato, como tantos francisquense ilustres e anônimos.
E o assunto foi as farras que o Quarenta fazia, nos finais de semana, horas antes do seu Vasco entrar em campo, principalmente contra o Flamengo. Quarenta costumava sair cedo, num jipe sem capota, com um bandeiraço do Vasco tremulando e pipocava foguetes pelas avenidas. Isso antes do jogo. “Se perdesse, já tinha feito a festa, se ganhasse, fazia mais”, conta ele às gargalhadas.
Nunca gostei de fogos de artifício, mas confesso que já fui até fogueteiro, num passado não muito distante, quando acompanhava o então prefeito da cidade, José Honório Machado, no final da década de 1990, outro vascaíno. Mas considero o foguete (barulho) uma agressão do ser humano contra si mesmo e contra os animais de estimação, que sofrem por demais.
Pois bem, o Quarenta, que é vizinho da família Caetano Oliveira, conta que ficou muito amigo do já falecido comerciante Élcio Oliveira, aquele que tinha um armazém ali onde é hoje um supermercado na avenida Jones dos Santos Neves.
O comerciante, não obstante sua generosidade e amizades, era tido como homem bravo, sério e que não gostava de certos comportamentos. Mas, num dia de jogo do Vasco em que o cruzmaltino conseguiu vencer uma – parece que ganhou um título -, o Quarenta resolveu disparar os foguetes comemorativos da janela dos fundos da casa. E tome foguetório.
Acontece que o vizinho, o comerciante Élcio, tinha um melro, pássaro de canto mavioso que antigamente habitava muitas casas.
No dia seguinte, Élcio chama o amigo Quarenta no canto para uma conversa:
“Eu baixei a cabeça e fui pra ouvir, errado e calado. O Élcio, muito sério e sem muita volta, me disse: ‘Quarenta, eu até que não importo com esse barulho de foguete, mas vou ter que te pedir pra parar, porque o meu melro já não aguenta mais’”.
*Weber Andrade é jornalista e colaborador do Tribuna Norte Leste
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