Weber Andrade*
Dia desses, fui assustado na rua por um veículo que se aproximou demais e buzinou. Com o canto do olho esquerdo percebi a cor vermelha e imaginei logo que seria o Jair Gervásio, um mecânico de picape e jipe antigos que conheço desde quando cheguei a Barra de São Francisco. Exclamei logo:
– Pé redondo!
Explico: o apelido foi sugerido pela filha dele, Fabiana, depois de muitos xingamentos durante as partidas de dominó na sua oficina, na rua Elizeu Divino. Nos chamávamos de ‘burro’, devido à pouca habilidade para a disputa.
Mas, voltando ao carro vermelho, que não era o Fiat Sedan do Jair Gervásio, vi logo a cara alegre e sempre jovial do meu grande amigo Milton, o Miltinho da Churrascaria Floresta, que chispou de Barra de São Francisco há duas décadas para ganhar dinheiro na terra dos candangos.
Uma alegria muito grande. O Miltinho sempre foi um sujeito muito boa praça e, nos poucos minutos em que conversamos, disse que tinha vindo visitar os irmãos e ficou muito surpreso com o progresso da cidade. “Quase não reconheci”, exclamou.
O motivo dessa crônica, o canto dos sanhaços, entrou nessa história justamente por causa do Miltinho que, por volta de 1995, ainda tinha a churrascaria ali perto da esquina da avenida Edinho Pereira com a Castelo Branco.
Atualmente, trabalho no centro, em frente ao antigo Cine Atlas e, todos os dias, um sanhaço solta seus trinados – um dos cantos mais felizes que já ouvi – na avenida, para alegria dos meus ouvidos.
Mas, naqueles tempos ia almoçar todos os dias na Churrascaria Floresta e, num desses dias, deparei com um filhote de sanhaço preso em uma gaiola pendurada na varanda do restaurante.
Era tão novinho que só sabia abrir o bico para pedir comida. Certamente foi tirado do ninho. Como sou muito apegado a animais ditos irracionais, comecei a tratar do filhote e, em dois dias, ele já vinha comer na minha mão.
A alegria, no entanto, durou pouco. Com menos de uma semana, o jovem sanhaço decidiu voar até uma árvore próxima. Voltou logo depois, pousou nos meus dedos e, antes que eu o devolvesse à gaiola, alçou voo de novo, para nunca mais voltar.
Meu amigo Miltinho ficou triste, mas o fiz perceber que um pássaro voando feliz é melhor do que um pássaro cantando triste numa gaiola. E, agora, os sanhaços que cantam perto de mim, parecem estar agradecendo a liberdade de um dos seus.
*Weber Andrade é jornalista, cronista e editor de Conteúdo do tribunanorteleste.com.br.
Comente este post