Weber Andrade
A dona de casa, Maria Joana de Souza, 41, olhava desolada para a prateleira de café em supermercado da cidade, na manhã desta quinta-feira, 6. “Até dois meses atrás, o pacote de meio quilo do café Bonzon custava menos de R$ 10 e hoje já passa de R$ 16”, constata ela, que culpa ‘a geada no Sul do país’, pela alta.
Pesquisa feita pelo site Tribuna Norte Leste, mostra que em janeiro de 2021, o pacote de meio quilo de café torrado e moído, saia por R$ 8,07, em média, nos supermercados da cidade e, neste início de ano, subiu para R$ 17,030, em média.
Já o açúcar teve aumento de 39,61% no mesmo período, passando de R$ 12,49 o pacote de 5 kg em janeiro do ano passado para R$ 18,62%, em média, nos principais supermercados da cidade.
O aumento dos dois produtos também refletiu no preço do tradicional cafezinho, vendido em padarias, bares e lanchonetes. Hoje, um cafezinho não sai por menos de R$ 1,00 e já chega a R$ 2,50, em algumas padarias de Barra de São Francisco.
Um representante de uma marca de café da região, disse que o preço do café in natura subiu mais de 100% nos últimos meses devido ao aumento do consumo interno durante a pandemia e também ao aumento das exportações. “Soma-se a isso a expectativa de uma quebra forte na safra deste ano”, analisa.
No ano, o café em grão subiu mais de 110% segundo dados da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), e a tendência é que o produto continue a subir em 2022, podendo chegar ao valor mais alto em 25 anos.
Segundo a Abic, a alta nos preços está ligada a uma série de fatores. “Há, primeiro, os danos climáticos na safra 2021-2022, mas também uma produção pequena em 2020-2021, uma demanda que cresceu na pandemia e custos de produção maiores com a alta do dólar.”
O cenário não é exclusivo do Brasil, e problemas de produção em outros grandes produtores, como Colômbia e Vietnã, também impactam nos preços. Criou-se, com isso, o que Celírio Inácio, diretor-executivo da Abic, considera ser um cenário raro, de grande especulação em torno dos preços do produto.
Açúcar
Segundo informações da União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica), as usinas do Centro-Sul processaram 19,68 milhões de toneladas de cana-de-açúcar no final do ano passado, queda de 46,77% em relação ao mesmo período do ano passado.
“O dólar acima de R$ 5,60 também é um forte estímulo às exportações brasileiras, o que ajuda a enxugar a oferta doméstica. Além disso, a gasolina mais cara nos postos de combustíveis estimula o aumento da produção de etanol em detrimento da de açúcar”, analisa a Unica.
Em outubro do ano passado, segundo a Unica, 60,89% da cana-de-açúcar processada foi destinada à produção do biocombustível e apenas 39,11% à de açúcar.
Crises do café
Segundo Inácio, o café é uma planta perene, que não costuma passar por grandes alterações de produções que levem a altas nos preços. Com isso, as crises ligadas ao produto são mais raras, e espaçadas temporalmente. Mas existe um fator em comum a elas: a causa é climática.
A última grande crise do café foi em 1994, quando uma geada atingiu os estados de Paraná e São Paulo, que na época ainda eram os maiores produtores. A saca do café ultrapassou US$ 200 à época com a queda na produção.
Antes disso, a chamada “geada negra”, também no Paraná, afetou a produção das safras para 1975, 1976 e 1977, e o cenário piorou com a disseminação de uma doença chamada ferrugem alaranjada. Com isso, a saca chegou a US$ 400.
Antes disso, em 1969, outra geada levou à perda de até 70% da safra daquele ano. Outra grande crise foi a da década de 1930, quando houve uma superprodução do produto, a oferta superou a demanda e os preços caíram.
O Brasil era o maior produtor mundial de café naquele período, com o produto com peso grande na economia, e o governo de Getúlio Vargas decidiu comprar e queimar estoques de café para manter os preços altos.
Comparativamente, a crise atual do café está seguindo o caminho das anteriores. Inácio afirma que, atualmente, a saca do café está em torno de R$ 1.200, ou cerca de US$ 213, em linha com preços de episódios anteriores.
Fatores para a alta
A análise dos preços do café leva em conta, primeiro, o fato dele ser um produto de cultura bianual. Ou seja, uma produção ruim em 2021 tende a impactar a de 2022, e a recuperação é vista apenas em 2023.
André Rolha, analista da Venice Investimentos, afirma que a falta de chuvas e as geadas no Brasil afetaram quase 589 mil toneladas de café, em especial em São Paulo e Minas Gerais, estado que concentra cerca de 50% da produção do grão.
A perspectiva ruim para a safra 2021-2022 se soma a uma produção baixa na safra de março de 2020 a setembro de 2021. “A safra passada (2019-2020) foi recorde, mas tivemos um aumento do consumo interno com a pandemia e um recorde na exportação. Ela foi em torno de 60 milhões de sacas. Essa safra foi menor, não deve passar de 47 milhões de sacas”, afirma Inácio.
A produção baixa e a perspectiva de números também reduzidos em 2022 criam um cenário especulativo, com os preços da safra 2021-2022 já sendo afetados. “Dependendo de como impacta o solo, a raiz, o produtor pode antecipar a produção e estocar prevendo uma alta de preços, e isso já tem sido repassado ao consumidor”, afirma Rolha.
Além das geadas, outro aspecto que tem afetado os preços do café é a alta do dólar. Por um lado, o real desvalorizado estimula os produtores a exportar o café, já que a lucratividade é maior, mas a baixa oferta no mercado interno faz os preços subirem.
Levando em conta esse cenário, Rolha afirma que 2022 deve ter a máxima em 25 anos do preço do café no Brasil. “Se considerar que vimos no ano uma saca até R$ 600 o quilo, o vencimento em dezembro já está a R$ 1.300 a saca do café arábico. O preço tem espaço para subir ainda mais”.
Comente este post