Pedro Valls Feu Rosa*
Nilza é uma senhora humilde, moradora de um dos tantos morros deste nosso Brasil. Padece em filas buscando obter saúde e educação para seus filhos, vez por outra sofre com a péssima infra-estrutura do local no qual reside, mas “vai levando a vida”.
De uns tempos para cá, porém, como se isto tudo não bastasse, surgiu mais um flagelo. Ele responde pelo nome de “Patão”. Trata-se de um criminoso que resolveu instalar-se por lá.
Apreciador de armas de fogo, fica com sua gangue exibindo-as na pracinha do morro, em plena luz do dia. E lá vai Nilza com suas crianças, cabeça baixa, humilhada sob os olhares daquele bando. Ir à igreja à noite, nem pensar – o jeito passou a ser orar dentro de casa.
Eis que policiais subiram o morro e, depois de um violento tiroteio, carregaram todos para a cadeia. Mas, como dizem que “alegria de pobre dura pouco”, em menos de duas semanas lá estava “Patão” e sua turma de volta ao morro. Disseram que houve um problema qualquer no processo deles. E eis Nilza de volta à sua triste rotina de humilhações.
Algum tempo depois, em seguida a alguma reportagem incisiva, nova operação policial. Após intenso tiroteio “Patão” e seus comparsas foram novamente presos. O morro, uma vez mais, suspirou aliviado – mas por pouco tempo. Menos de um mês depois lá estavam todos de volta, colocados em liberdade por serem primários e terem bons antecedentes – nosso sistema legal ignora que quem é bondoso com os lobos condena os carneiros.
Para resumir: “Patão” foi preso e solto umas seis ou sete vezes até ser morto a tiros. Foi rapidamente sucedido por “Pé Grande”, e aí começou tudo de novo.
Esta é, sem retoques, a realidade de 70% dos morros brasileiros. Convidado a dar sua opinião acerca do problema da segurança pública no Brasil, o Chefe de Polícia de Nova York, William Bratton, assim falou: “O Judiciário não funciona. Os policiais não trabalham em harmonia com os promotores, que não atuam em conjunto com os juízes. A Polícia Militar não trabalha em consonância com a Civil”. Será que ele tem razão?
Enquanto isso Nilza segue, resignada, sua rotina diária de humilhações. Não nos lamentemos por ela, pois, como dizia Billings, “ter pena não custa nada e não vale nada” – o que se espera são ações efetivas em defesa de sua dignidade de cidadã, e não piedade.
*O desembargador Pedro Valls Feu Rosa é articulista de diversos jornais com artigos publicados em diversos Estados da Federação, além de outros países como Suíça, Rússia e Angola.
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