Este é um texto polêmico, mas necessário. Como polêmicos e necessários serão os seguintes, de uma trilogia na base do “curto e grosso”. Para abrir o debate.
Nos últimos dias, nunca se viram, no Espírito Santo, tantas operações das forças de segurança, municipais, estaduais e federais, e tantas prisões, apreensões de armas, de drogas em grandes quantidades.
Fica a impressão de um eterno enxugar de gelo. Não acaba nunca.
Tudo por conta de uma hipocrisia que vivemos em nossa sociedade. O Estado gasta uma fortuna com o aparelho repressor, mas nada se resolve.
É preciso ter coragem para enfrentar o falso moralismo e dizer: vamos acabar com essa brincadeira e legalizar, definitivamente, o uso de drogas.
Não se trata de apologia, mas de realidade. Os Estados Unidos um dia tiveram a chamada “lei seca” e nunca se bebeu tanto, clandestinamente, e nunca a máfia que explorava o tráfico de bebidas prosperou tanto.
Quem vive do tráfico não quer a legalização, porque eles perderiam seu instrumento de poder.
Agora, respondam com honestidade: o fato de ser proibido impede o uso por quem quer que seja? Definitivamente, não.
Causa arrepios ver o nível de sofisticação dos traficantes, grandes e pequenos, para servir ao seu mercado. Chegamos ao absurdo do uso de um avião da comitiva presidencial para levar drogas ao Exterior. Mas somente os pequenos caem.
E as populações periféricas ficam reféns dessa violência estabelecida, porque o Estado não dá conta, simplesmente porque não tem como dar.
Gritarão os moralistas. Que gritem. Não posso impor à sociedade minha moral. Cuido disso dentro da minha casa. Mal e porcamente.
O Estado pode ajudar, se proporcionar a cada família condições de acesso à educação, saúde e segurança como prevê a Constituição. O dinheiro para isso virá da economia que se fará com menos operações policiais, menos armas. E menos vidas de policiais ceifadas em confrontos desiguais.
O policial vai para o embate com o livrinho da lei na mão, o delinquente vai para matar ou morrer.
E, nessa leva, quem morre não é o dono do grande negócio, mas o maluco desnorteado que assume o risco.
Muitos são presos por pequenas quantidades, jogados na sala de aula da faculdade do crime e saem piores do que entraram.
O Brasil não planta um pé de coca. Quem tem os aviões? Quem tem os barcos? Quem tem os carrões, os caminhões que transportam a droga? Seguramente, não estão na periferia da sociedade.
Mas esses dificilmente são apanhados e muitos estão infiltrados nas corporações e instituições, por vezes escondidos atrás de uma fachada de negócio lícito, postando nas redes sociais, vivendo na luxúria, debochando da cara da sociedade, enquanto seus “soldados” morrem ou são presos. Na maioria das vezes, pretos e pobres.
Nos meus tempos de assessoria no Judiciário, ouvi duas falas que me impactaram.
Uma, de um procurador da República Italiana, que atuou na “Operação Mãos Limpas”, e outra, de uma autoridade acadêmica num seminário sobre a questão das drogas, com baixíssima audiência.
Do procurador, ouvi que não se combate a corrupção com prisão, mas com o confisco dos bens, pois aí está o poder do corrupto.
Da autoridade na questão das drogas, que a atenção primária precisa estar no indivíduo. Cuidando-se da pessoa retira-se o mercado do traficante. A droga não existe sem o seu usuário.
Então, com base nessas premissas, que tal mudar o foco? Libera o uso e investe no cuidado com a pessoa para que não se torne um dependente. Isso vai cortar as pernas do tráfico.
Em tempo: #nuncausei
(José Caldas da Costa, jornalista, geógrafo, especializando em desenvolvimento humano e psicologia positiva)
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