*Maciel de Aguiar
Continuo realizando as visitas às comunidades quilombolas do Sapé do Norte, nos municípios de São Mateus e Conceição da Barra, por onde andei, de 1965 a 1995, pesquisando as histórias dos heróis negros que enfrentaram a escravidão e foram “esquecidos” pela historiografia oficial.
Publiquei a História dos Quilombolas (composta de 40 livros, com base na oralidade) sem recursos financeiros municipal, estadual ou federal para a sua edição e jamais contou com o farto dinheiro dos editais ou das leis Rouanet, Paulo Gustavo e Aldir Blanc.
Foi tudo pesquisado, escrito e publicado com recursos próprios, e, lamentavelmente, com alguns governos e prefeituras (com gestão de partidos de esquerda, que dizem apoiar os negros e defender a igualdade), que não compraram esses livros, e, quando compraram, alguns não pagaram. Deram calote!
No início da década de 1960, com 13 anos de idade, iniciei as pesquisas e entrevistei centenas de quilombolas – quando ainda não era moda – e muitos tinham mais de 100 anos de idade e eram negligenciados, abandonados e esquecidos.
Com esses livros – reafirmo, publicados com recursos próprios -, enfrentei a historiografia oficial, que não reconhece um trabalho pioneiro e inédito no Brasil, decorrente de décadas, embora muitos desses livros sejam plagiados e copiados por vários acadêmicos que fazem teses de mesmtrado e doutorado sem citar as suas fontes – sobretudo, copiando as histórias de Zacimba Gaba, Constância de Angola, Negro Rogério e Benedito Meia-Légua, dentre outras, que também são utilizadas em livros e ou divulgadas em vídeos, nas redes sociais, como sendo de suas autorias -, e esses “autores” jamais entrevistaram quem eu entrevistei e ou testemunharam as suas belas e extraordinárias aventuras em busca da liberdade.
Também escrevi, na semiclandestinidade, 80 pequenos livros publicados em mimeógrafo, durante a ditadura militar; e todos eles, por certo, ajudaram a levar o meu nome à indicação do Prêmio Nobel de Literatura.
Foi uma memorável jornada de lutas intensas, persistentes e emocionantes, resgatando personagens desconhecidos que enfrentaram a escravidão e que (ainda) não são valorizados e não fazem parte dos livros que estudamos nas escolas.
Assim como também escrevi “Os anos de chumbo”, de 1970 a 1985, recentemente editados em 4 volumes, com 620 páginas cada exemplar – também publicados com recursos próprios – contando as lutas de muitos que morreram sob tortura praticada pelo Estado brasileiro e vários corpos não tiveram direito à sepultura.
Portanto, mesmo que não ganhe o Prêmio Nobel de Literatura – concedido pela Academia Sueca – conforme a indicação de meu nome para a maior honraria acadêmica do mundo, considero uma grande vitória daquele menino que, aos 13 anos de idade, queria ser escritor.
Por isso, ao visitar as comunidades quilombolas – algumas mais de meio século depois – e encontrar os filhos, netos e bisnetos dos que entrevistei, e, principalmente, ser recebido com festa, manifestação cultural e mesa posta, sinto o mesmo valor se estivesse recebendo o Prêmio Nobel de Literatura.
Obrigado pelo reconhecimento, a valorização, a receptividade e a mesa posta.
Estou muito feliz!
*Maciel de Aguiar é escritor de mais de 140 obras
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