*Erly Euzébio dos Anjos
Sou um dos que pensam que um governo autoritário, como passamos nos ultimos quatro anos, nos levou a um retrocesso e que, se se reelegesse, poderia nos levar a uma paralisia na conquista de mais direitos e bem-estar coletivo.
A diferença de votos foi pequena e a estratégia de se formar uma “frente ampla e democrática” foi e será a bala de prata para reverter tendências negativas que já se arvoravam.
Não prescrevo a veneração pura e simples de um líder, tido como salvador da pátria. Prefiro ficar com antenas ligadas para seguir os caminhos e projetos de reconstrução social, mas com criticidade. Principalmente, neste novo mundo em que vivemos, difícil de se distinguir fatos de versões.
Tenho, ainda, uma curiosidade aguçada para compreender as ideias, atos e ações em jogo que podem nos tirar do pântano em que nos encontrávamos e torcer para as mudanças que nos leve a uma sociedade, sim, mais justa, igualitária e fraterna.
Como muitos, acompanho os acontecimentos nacionais e de fora, pela mídia e tento buscar livros que forneçam pistas para se sair do atual imbróglio.
Nesta toada me deparei com um livro – escondidinho num canto de uma livraria, pois agora os livros, tidos como best sellers ou mais vendáveis, se mostram mais as claras -, cujo título: ‘Brasil Sob Escombros – desafios do governo Lula para reconstruir o País’, organizado por Juliana Paula Magalhães e Luis Felipe Osório (Boitempo, 2023, 175 pgs) que é uma mão na massa. É uma coletânea de artigos de especialistas na área das ciências humanas, é claro, que se preocupam em fazer um diagnóstico realista do terceiro governo Lula e apontar saídas. Com umas fortes doses de críticas contundentes e esclarecedoras que valem a pena consultar.
Chamo atenção para um dos últimos artigo, “Brasil 2023: margens de golpes e lutas”, do jurista e filósofo da USP Alysson Leandro Mascaro, autor do livro Crise e Golpe (Boitempo, 2018) em que ele analisa a tal frente ampla como uma “confluência ao centro, mantendo-se tanto as pontas da direita liberal quanto da esquerda liberal”, onde ele enxerga “uma estratégia de articulação entre dinâmicas e manutenções.”
Em seguida, o autor mais contundente “crava o prego na ferradura” ao mencionar que: “Excluída qualquer hipótese de câmbio estrutural revolucionário da sociedade – a esquerda institucional e governante bloqueia mais uma vez desde de a saída da ditadura, qualquer clamor efetivamente mais à esquerda -, também se pretende eliminar do cenário os resíduos de extrema direita manifestados pelo golpe de 2016, embora não suas causas” (pag. 170 e ênfases minhas).
Isso nos retira da percepção mais imediata no âmbito das notícias diárias para nos levar a compreender o que pode, de fato, ocorrer. Com isso dissipar ilusões e se ter uma visão mais realista e crítica da realidade nacional.
Reconheço e acolho a ideia de que que nos livramos de um caminho sem volta, com o aniquilamento de conquistas sociais. Que o processo de reconstrução requer muito jogo político de conciliação e de convencimento. Mas sem perder a noção de vivemos em outra realidade local e global.
A primeira fuga na penitenciaria federal de segurança máxima é um alerta de que não se pode descuidar das articulações, no caso, das situações das prisões intramuros com as organizações do crime fora. Mas ainda há tempo de se conhecer as falhas e se redimir, com inteligência e gestão eficiente.
*Erly dos Anjos é sociólogo, professor aposentado da UFES
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