Detenções prolongadas, desaparecimentos, perda de contato com a família, falta de água e de comida, exploração por “coiotes”, aliciamento por traficantes, violações de direitos humanos, deterioração da saúde física e mental, morte por fadiga, afogamento, desnutrição, violência física. Estes são alguns dos riscos que correm as pessoas que contratam serviços de coiotes com a esperança de entrar ilegalmente nos Estados Unidos e tentar viver o “american dream” (sonho americano).
Pode ser uma viagem sem volta, literalmente. E não apenas porque, depois que está lá, a pessoa não pode mais sair. Além dos custos abusivos, os riscos de tentar imigrar de forma ilegal nos Estados Unidos, atravessando a fronteira com o México, são enormes e precisam ser levados em conta por quem resolve abandonar tudo, muitos fazendo dívidas impagáveis, principalmente se tudo der errado, e empreender numa aventura perigosa nas mãos de pessoas sem escrúpulo que enriquecem colocam em risco a vida alheia.
Tudo isso está numa cartilha preparada pela Divisão de Assistência Consular do Ministério das Relações Exterior do Brasil. O documento foi divulgado entre a comunidade brasileira nos Estados Unidos pelo portal AcheiUsa.Com e pode ser lido na íntegra também aqui: Imigração ilegal – cartilha do Itamaraty.
O Itamarati (nome do Palácio que sedia do Ministério) registra que a imigração é irregular quando a pessoa não tem os requisitos necessários para entrar e permanecer no país estrangeiro.
HUMILHAÇÃO
“Cada país tem suas próprias regras para autorizar ou não a entrada e a permanência de pessoas em seu território. Em busca de melhores condições de vida, muitas pessoas têm tentado entrar irregularmente nos Estados Unidos, especialmente através da fronteira terrestre com o México. Essa travessia envolve enormes perigos e muitos acabam passando por humilhação, violência ou mesmo perdendo suas vidas tragicamente, sem nunca conseguir completar a viagem. Não seja uma dessas pessoas!”, alerta o documento.
Para fugir dos controles migratórios, alguns viajantes recorrem aos contrabandistas de migrantes, chamados “coiotes”, que se oferecem para guiá-los em troca de muito dinheiro. Essas viagens são feitas de forma clandestina, por estradas secundárias, passando por rios e desertos, até mesmo a pé.
A cartilha alerta que “muitas pessoas não suportam as condições da viagem e os coiotes abandonam no caminho os que não conseguem acompanhar o grupo, como aconteceu em setembro de 2021 com a brasileira Lenilda dos Santos, 49 anos, que foi encontrada morta por agentes do estado do Novo México (EUA), abandonada pelos coiotes, com fome e sede em pleno deserto.
“Esses caminhos clandestinos também são usados pelo crime organizado. Você pode se tornar vítima do tráfico de pessoas e de ser aliciado, roubado ou sequestrado por traficantes de drogas e de armas”, alerta o documento do Itamarati.
Foi o que aconteceu em dezembro último com a jovem brasileira Jessiane Gonçalves Schneider, 24, que foi sequestrada, amarrada, amordaçada e violentada por coiotes quando tentava atravessar a fronteira do México com os Estados Unidos. Jessiane foi encontrada por um fazendeiro na região entre a cidade mexicana de Ciudad Juarez, a mais violenta do México, dominada por gangues de traficantes, e a americana El Paso, em 5 de dezembro.
MÁFIA
O Brazilian Times, jornal brasileiro nos Estados Unidos, foi o primeiro a divulgar a história dessa jovem da cidade de Buritis, no Estado de Rondônia, em reportagem de Lucci Luciano. A partir da publicidade dada ao drama da brasileira, amigos e parentes passaram a temer pela vida de Jessiane Schneider, que foi internada num hospital da região em estado grave. O temor era que a máfia dos coiotes fosse atrás dela. E foi feita uma vaquinha para ajudá-la.
O jornal conversou com a empresária Ivana Braga Vasquez, que mora na cidade de Worcester (Massachusetts) e é amiga da família. Ela iniciou uma campanha no dia 17 de dezembro e até a o dia 2 de janeiro havia arrecadado quase US$15 mil (R$ 80 mil).
Ivana agradeceu ao jornal Brazilian Times, pois após a notícia, outros veículos de comunicação também relataram o fato e as doações aumentaram, conseguindo atingir o objetivo. Toda a arrecadação será usada para pagar as despesas do hospital onde ela está, na cidade mexicana de Juarez. “Graças Deus temos o dinheiro para os custos médicos e um pouco para ela fazer um tratamento para se livrar deste trauma”, disse.

De acordo com Ivana, um pastor da cidade de Worcester conseguiu levar a mãe de Jessiane até ao México. Ela acompanha a filha que ficou em coma quase dez dias. A jovem aguardava uma cirurgia no rosto, onde teve vários ossos fraturados pela agressão. Ivana destacou que amigos acionaram o consulado e pediram urgência na repratriação, pois Juarez é uma cidade perigosa e mantê-la no hospital é um risco. “Temos medo que a máfia dos coiotes possa ir atrás dela”, disse.
De acordo com as informações, Jessiane ficou dois meses no México antes de iniciar a travessia da fronteira rumo aos Estados Unidos. Ela deixou a cidade de Buritis e ficou esse período em uma casa com outros brasileiros. Todos conseguiram atravessar, mas quando chegou a vez dela, a jovem caiu nas mãos dos sequestradores. Eles a mantiveram presa e exigiram, dinheiro da família e afirmaram que iriam entregar a rondoniense para agentes de imigração e tudo ficaria bem.
“Nós ficamos nove dias sem contato com ela, até que uma enfermeira ligou para o Brasil e achou a família dela pelo sobrenome, no Facebook. Foi uma dificuldade porque ela fala espanhol e a família pensou que fosse trote”, explicou Ivana.
Jessiane chegou ao hospital com uma corda no pescoço, desacordada e com vários ferimentos. O marido chegou três meses antes dela a New Jersey.
Em nota, o Itamaraty informou que ” tem conhecimento do caso e vem prestando assistência à nacional e à sua família, em conformidade com os tratados internacionais vigentes e com a legislação local”. O Ministério das Relações Exteriores acrescentou que não pode dar detalhes do caso “em atendimento ao direito à privacidade e em observância ao disposto na Lei de Acesso à Informação”. (Da Redação em Vitória)
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