*José Caldas da Costa
A imprensa do Rio noticiou nos últimos 7 dias dois importantes fatos em relação à vida na Cidade Maravilhosa, com repercussão no restante do Pais: a operação da Polícia Federal que resultou na determinação judicial de afastamento da deputada estadual Lucinha (PSD) e a rendição do miliciano mais procurado daquele Estado, Luiz Antônio da Silva Braga, o Zinho.
São desdobramentos de um triste enredo de prevaricações que conduzem a um estado de desordem social e institucional que, inocentemente, a gente pensava somente existir nos “distantes” mundos da máfia italiana, da máfia de Chicago ou dos cartéis do narcotráfico colombianos, o mais notório o de Pablo Escobar, que, ameaçado por seus inimigos, construiu um presídio de segurança (e conforto) máxima e se entregou às autoridades daquele país.
Para entender os (des)caminhos que levaram ao momento atual é imprescindível ler “Milicianos – como agentes formados para combater o crime passaram a matar a serviço dele”, uma competente pesquisa do jornalista Rafael Soares, repórter policial de O Globo, que mergulhou em inquéritos e processos, entrevistou agentes estaduais e federais e revisitou o noticiário dos tempos em que ele era apenas um adolescente.
Já ouviram falar de Ronie Lessa, Capitão Adriano, vereadora Marielli, Castor de Andrade, bicheiros, Comando Vermelho, Bope, juza Patricia Acioli e, sim, família Bolsonaro? Sim, está todo mundo lá dentro da robusta obra de Rafael Soares. Só para lembrar os mais notáveis, mas tem muito mais.
E, para quem acha que isso não tem nada a ver com a gente, é bom lembrar que as operações da Polícia Federal contra as milícias – foram 6 somente neste ano -, e que levaram à prisão do chefe do “Bonde do Zinho”, sucedâneo da Liga da Justiça, haviam sido congeladas nos últimos quatro anos. Mas isso é apenas um detalhe. Ou não.
“Milicianos”, de Rafael Soares, saiu agora em dezembro, pela Editora Objetiva, poucos dias depois que o jornalista Danilo Salvadeo conseguiu lançar, com produção independente, ou seja, às suas próprias custas, o seu “Máfia Capixaba”, que tem conteúdo equivalente, com igual esforço de reportagem, sobre a atuação do Condomínio do Crime, que decidiu sobre a vida e a morte de importantes personalidades até a execução do juiz Alexandre Martins Filho, em 2003.
Salvadeo, assim como Rafael demonstra em seu “Milicianos”, mergulha em duas décadas de inquéritos, processos, revisão de reportagens, entrevistas, para mostrar que a contravenção, os descaminhos com a coisa pública e a eliminação de quem se põe no caminho de pessoas com alma criminosa, não obedece fronteiras.
Ninguém pode ter certeza de onde isso vai parar, porque parece que quadrilhas se sucedem. A reportagem apurou, por exemplo, que em municípios do Sul capixaba, próximos ao Rio de Janeiro, milicianos estão infiltrados em ações nada republicanas nos municípios enricados com os royalties do petróleo. Esta é uma missão para o Gaeco do Ministério Público Estadual, que há muito monitora essa presença.
Sejam por “Milicianos” fluminenses, a “Máfia Capixaba” ou os tentáculos do PCC, com atuação transacional tornando-o na maior organização criminosa do mundo atualmente, estamos vivendo sobre o fio da navalha.
O esforço de reportagens de jornalistas à moda antiga, como Rafael Soares e Danilo Salvadeo, é imprescindível para que ninguém mais viva na ilusão. E para desmistificar a polícia que mata à margem da lei.
*José Caldas da Costa é jornalista há quase cinco décadas, diretor do portal Tribunanorteleste.com.br
Foto da capa: montagem com o carro metralhado da juíza Patrícia Acioli (destaque) executada por policiais milicianos
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