O pecuarista Otávio (nome fictício), chegou no início desta semana ao salão onde sempre costuma cortar o cabelo no centro da cidade. Desconfiado, separou uma nota de R$ 20 – para pagar o corte – e pediu licença ao dono do salão para usa-lo como ‘escritório’, antes de ir à cadeira. Enquanto contava os maços de cédulas, ia xingando o atual presidente, Lula, pela queda no preço da arroba do boi: “Ninguém quer comprar e quando aparece comprador é picareta”, reclamou.
No açougue, porém, a conversa é um pouco diferente. A dona de casa Maria do Socorro, espia as vitrines e arrisca a dizer que já dá pra comer um pedaço de carne de boi. “Ainda está muito caro, mas está abaixando. Picanha ainda não é pra nós”, brinca ela referindo-se ao mote da eleição passada, quando se dizia que o povo iria voltar a comer picanha.
A pesquisa do Índice de Preços ao Consumidor (IPCA), divulgada esta semana, aponta que o preço da carne bovina está em queda e todos os cortes ficaram mais baratos em agosto. O destaque é para o filé-mignon, que ficou 15% mais em conta na comparação com um ano antes.
Outros cortes que se destacaram na deflação foram peito, alcatra e capa de filé.
Por que caiu?
A queda é influenciada pelo preço com que o boi é vendido no campo, que, apenas neste ano, diminuiu cerca de 30%, na comparação entre janeiro e setembro. Esse declínio, por sua vez, é motivado pela alta oferta de animais no pasto.
Ainda assim, outros custos da cadeia de carne bovina estão impedindo que o produto nos supermercados tenha queda ainda mais intensa, como o fato de ter menos abates pelos frigoríficos, por causa da queda no consumo.
Além disso, as redes varejistas estariam mantendo uma margem alta de lucro neste ano, segurando os preços, afirma o analista da Safras & Mercado Fernando Henrique Iglesias.
A Associação Brasileira de Supermercados (ABRAS) disse que é preciso considerar os custos de logística, de energia, na armazenagem, na exposição nas lojas, bem como, a demanda da carne bovina no mercado internacional.
O Brasil está em um período com uma grande oferta de bois devido ao aumento do abate de fêmeas, o que desvaloriza o preço no mercado. Esse movimento já era previsto, aponta o analista Iglesias.
Esse processo faz parte do que é chamado de ciclo pecuário. Se trata de quando os produtores seguram as vendas dos animais porque estão valorizados no mercado, o que vai elevando o preço da carne. Foi o que aconteceu, por exemplo, no ano passado.
Com isso, as vacas continuam reproduzindo até que haja muitos bezerros no mercado. Então, os preços caem e volta a acontecer o abate das fêmeas, levando mais carne para as prateleiras, que é o momento atual, explica o analista.
Outro ponto que aumenta a oferta de carne e barateia os custos no campo é o clima, que está ajudando a melhorar a qualidade do pasto, por causa do maior volume de chuvas, permitindo que haja menos gasto com rações, aponta Felippe Serigati, do Centro de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV Agro).
O gado que se alimenta de ração também está comendo bem, uma vez que houve queda no preço de grãos, como soja e milho, que recuaram 20% e 30% nos últimos 12 meses, respectivamente, segundo dados do Cepea.
Ainda assim, por causa dos custos de outros pontos da cadeia, essa economia não é repassada ao consumidor na mesma intensidade.
Por que o preço cai mais no campo?
Apesar de os pecuaristas estarem vendendo o boi a preços menores para os frigoríficos, há outros custos na cadeia que acontecem depois dessa etapa e que impedem que o consumidor pague menos pela carne, explica Serigati.
Uma dessas etapas mais importantes é a escala de abate, aponta o professor. Há menos gente comprando carne, com isso os frigoríficos compram menos animais, uma vez que não há tanta saída para o consumidor final, segurando a oferta nos supermercados.
Há ainda o custo de logística, que está alto por causa do preço do combustível. (Da Redação com g1 Agropecuária)
Comente este post