Weber Andrade*
O filho do dono de um lava-a-jato de Barra de São Francisco, na saída para a AABB, confirmou à reportagem do www.tribunanorteleste.com.br que seu pai ganhou uma ‘bolada’ em uma rifa promovida pela blogueira Érica Vieira Fonseca Soares recentemente. “Ele ganhou vários prêmios, uma moto de alta cilindrada, tv smart, 50 cestas básicas, tudo entregue aqui mesmo pela Érica”, informa o rapaz que diz jogar na rifa dela quase que diariamente.
Érica, segundo informações obtidas pela nossa reportagem, até pouco tempo atrás trabalhava como comerciária em uma loja da cidade pertencente a uma rede lojista famosa no Espírito Santo e atualmente mora em Montanha, Norte do Espírito Santo.
Agora, ela é o assunto mais comentado nos fins de tardes em bares da cidade. E não é para menos. Em sua página no Instagram, ela mostra os sorteios feitos com base na loteria federal – uma cartela custa, de início, R$ 0,10 – e entregas de carrões como uma BMW, em Barueri (SP), motocicletas, veículos utilitários e outros, além de prêmios em dinheiro, de R$ 10 mil, R$ 50 mil…
Na manhã desta terça-feira, 30, enviamos mensagem para ela informando nossa condição de repórter, e pedindo uma entrevista, e ela nos enviou seu contato pessoal (whatsapp). No primeiro momento, não conseguimos completar a ligação. Depois, ela fez contato por mensagem, inclusive de voz.
ORIGEM POBRE
Érica nos concedeu uma entrevista exclusiva, que reproduzimos aqui quase na íntegra:
“Eu fui criada em Ecoporanga, mais precisamente em São Geraldo, num interiorzinho, minha mãe sempre me criou sozinha desde os meus 7 meses sem a presença paternal, e nossas condições eram muito ruins.
Para dar uma vida melhor pra minha mãe, eu decidi que iria pra cidade trabalhar e ajudar minha mãe. Fui pra Ecoporanga quando completei 16 anos, trabalhei vendendo pães e bolo na rua e ganhava 15 reais por dia. Assim consegui emprego em um escritório de advocacia, fiquei por 8 meses, onde eu trabalhava de 7 da manhã às 17h30 e recebia um salário de 400,00 reais mensais. Naquela época aluguei um cômodo em Ecoporanga de 150 reais, incluso água e luz, e tinha um amigo que morava na cidade de Barra de São Francisco”.
MERCADÃO
“Ele me disse que lá as condições de trabalho eram melhores e, como eu visava um crescimento, fui pra Barra de São Francisco já com 17 anos, sem nenhuma perspectiva do que fazer, pois não consegui trabalho sendo de menor.
Eu ia em Ecoporanga de ônibus todo mês pra pegar os mantimentos que minha mãe me dava e voltava pra Barra de São Francisco, e assim foi até eu completar 18 anos.
Assim que completei 18 anos, coloquei o meu currículo no Sine em Barra de São Francisco, e logo fui chamada para uma entrevista com 30 pessoas para o Mercadão Moda e, dessas 30 pessoas só foram selecionadas três pessoas. Eu fui uma das trés selecionadas.
Comecei a trabalhar em novembro de 2020 no Mercadão Moda como freelancer de fim de ano e assim fiquei em primeiro lugar de vendas nos três meses consecutivos.
Em uma seletiva de 12 pessoas pra serem selecionadas quatro, e fui contratada oficialmente de carteira assinada. Trabalhei no Nercadão Moda por 1 ano e 1 mês, onde aprendi muito e sou muito grata tanto pela cidade quanto pela vaga de emprego”.
NAMORADA
“Meu fim no Mercadão chegou dando assim espaço pra trabalhar na Cia Do Cheiro, onde fiquei por seis meses. Nesses 6 meses conheci (pela Internet) minha esposa, que morava em Montanha. Logo fui demitida por não estar tão atenta no serviço, e digo que foi a melhor coisa que já aconteceu na minha vida, ser demitida!
Eu fui pra Montanha morar com minha, então, namorada até o momento, lá ela tem uma lanchonete onde começamos a trabalhar juntas. Fui motoboy, chapeira, atendente, operadora de caixa entre todas as outras funções até que começamos a fazer eventos, promovíamos festas na cidade de Montanha, através da produtora que criamos R&E produções e, sempre com muita vontade de ir além, decidi entrar no mundo da internet”.
AÇÕES NA INTERNET
“Começamos as ações. Quando começamos, muita gente desacreditou, tanto que minha primeira ação demorou cerca de quatro meses pra finalizar, mas não perdi o foco e não deixei isso me abalar, até porquê a emoção do ganhador foi maior do que tudo que eu já tinha vivido na vida.
Foi aí que, a partir desse momento, eu decidi não parar. Fiz a segunda, a terceira, a quarta, comecei a fazer projetos sociais, ajudar pessoas através da internet e fora dela, até que cheguei onde estou hoje.”
CESTAS BÁSICAS
“Essa entrega que fiz em Barra de São Francisco foi a entrega em que mais me emocionei, por ser a cidade que me acolheu, que me recebeu de braços abertos e me ensinou tudo que sei hoje, me ensinou a trabalhar, me ensinou a correr atrás dos meus objetivos. E cada vez mais ver pessoas daí participando das minhas ações, ganhando e realizando sonhos me motiva muitooooo!
Eu digo pra todos, quem tem um sonho, nunca desista, coloque Deus nos planos e se for na hora dele, será. Para o meu sonho acontecer, demorou 8 anos desde 2016 até agora! Em relação às cestas básicas, em todo projeto meu de ação de carros eu coloco 50 cestas básicas para o ganhador também abençoar outras 50 pessoas, como ele já foi abençoado como ganhador da ação, eu entrego as cestas pra outras pessoas serem abençoadas juntas.
Eu sei o que passei pra comer, para conseguir me manter, para às vezes não ter um arroz, um feijão, uma mistura e nisso eu me sensibilizo com todo mundo ao meu redor. E em todas as ações realizadas e finalizadas, são doadas no mínimo 20 cestas básicas pra pessoas carentes e entidades.
As vezes eu saio nos interiores e entrego pessoalmente pra famílias carentes, é algo que eu não posto, pois acho que quando você faz uma ação de coração, não precisa ser postada.
Minha história é bem sofrida, nada foi muito fácil, sempre passamos por situações muito difíceis, de vivências, de comida, de estudo e hoje que graças a Deus melhoramos as condições faço de tudo pra não ver ninguém passando o que já passamos.”
Nota da Redação: A influenciadora, após a leitura da matéria, disse que não gostou do conteúdo: “Pareceu que meus sorteios são errados, não gostei mesmo. Eu estou em processo de legalização, já passo uma luta danada com tudo, e essa matéria então…”, lamentou.
NEM SEMPRE É ASSIM
Fomos atrás de mais informações sobre as rifas nas redes sociais e descobrimos que Érica não está sozinha, pelo contrário, tem dezenas, centenas, de ‘influenciadores’ que reúnem dezenas de milhões de seguidores, com a promoção de rifas e ganham muito dinheiro com isso.
No entanto, de acordo com autoridades ouvidas pela nossa reportagem, a promoção de rifas é ilegal e é objeto de investigação policial em ao menos três Estados e no Distrito Federal. Já há influenciadores presos sob a acusação de associação criminosa, lavagem de dinheiro e até estelionato, após relatos de que os prêmios não são entregues ou são concedidos a pessoas conhecidas, que depois devolvem os itens.
Não é o caso de Érica. Pelo menos em Barra de São Francisco, há mais relatos de ganhadores de outros prêmios menores, mas sempre entregues.

O Ministério da Fazenda, consultado, disse que “não existe rifa legalizada. As rifas são todas, em princípio, ilegais, ressalvados os sorteios filantrópicos.”
CONTRAVENÇÃO PENAL
A realização de rifas é tipificada como contravenção penal, assim como o jogo do bicho, e possui pena de prisão de três meses a dois anos, além de multa de R$ 2.000 a R$ 200 mil.
O site Terra, em sua página Aos Fatos, conta que analisou 193 perfis de influenciadores que realizam rifas, sendo que oito deles têm entre 1 milhão e 9,1 milhões de seguidores no Instagram.
O método utilizado é semelhante em todos os casos: publicar conteúdos nas redes para divulgar sites em que o usuário faz o pagamento e recebe um número para o sorteio.
Por meio da ferramenta Dnslytics, o Aos Fatos identificou 333 sites de rifas que têm características em comum, indício de que compõem uma rede. Essas páginas possuem estrutura, interface, painel de controle e conteúdos idênticos. Todas estão hospedadas no serviço da AWS (Amazon Web Services) e os domínios foram registrados por ao menos 24 empresas e 193 influenciadores, entre eles atletas, políticos e modelos.
SITE DE ÉRICA
Érica divulga o site ericavieirapremiacoes.com para que seus seguidores comprem bilhetes e concorram a carros, celulares e prêmios em dinheiro.
O principal meio de divulgação é o stories, recurso do Instagram que as publicações ficam disponíveis por apenas 24 horas, que também é usado por outros influenciadores digitais.
A influenciadora informa que os sorteios ocorrem com base em extrações da loteria federal, da Caixa — ou seja, o número do bilhete vencedor depende de algum sorteio da loteria federal, que acontece às quartas e sábados.
De acordo com a coluna Aos Fatos, do site Terra, no momento da compra, no entanto, a maioria dos sites não informa a data exata do sorteio, que é anunciado posteriormente pela influenciadora.
“Quando eles (os influenciadores) utilizam essa justificativa, na verdade querem dizer que o sorteio é vinculado com o resultado da loteria federal. No entanto, a autorização pela Loteria Federal não existe mais, agora é mediante o Ministério da Fazenda”, explica Juliana Macedo, advogada e especialista em direito digital.
Ela informa ainda que o problema está no ato de pagar por um número em troca da possibilidade de receber um prêmio. “O que difere o sorteio da rifa é a venda direta de números. Essa venda direta não pode ocorrer de jeito nenhum, visto que um número é algo abstrato. Como você vai vender algo que é uma chance, que não é palpável?”, disse.
ILEGAL
A distribuição de prêmios em operações como sorteios, vales-brinde e concursos organizados por organizações da sociedade civil é permitida desde que haja autorização prévia do Ministério da Fazenda, concedida somente a pessoas jurídicas.
Para obtê-la, é necessário enviar um pedido ao SCPC (Sistema de Controle de Promoção Comercial) e apresentar ao menos uma das 13 finalidades definidas pela legislação, como promoção da assistência social, educação ou saúde.
Ainda que o sorteio esteja em situação regular, o Ministério da Fazenda proíbe algumas práticas. Não é permitido, por exemplo, distribuir ou converter prêmios em dinheiro — prática comum entre as ações divulgadas por influenciadores.
Também não são autorizados sorteios que proporcionem lucro imoderado, nem que se transforme a autorização emitida pela pasta em uma exploração dos sorteios como fonte de renda.
*Com informações da página Aos Fatos do site Terra.com.br

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