*José Caldas da Costa
O Espírito Santo tem potencial para irrigar 600 mil hectares de terras plantadas, independente de qualquer medida, como a criação do Polo de Agricultura Irrigada, em curso no Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional, numa iniciativa provocada pelo deputado estadual Mazinho dos Anjos (PSDB) e que, agora, tem a adesão também do deputado Lucas Scaramussa, presidente da comissão de agricultura da Assembleia Legislativa.
A informação é do pesquisador Lineu Neiva Rodrigues, engenheiro agrônomo, mestre e doutor pela Universidade Federal de Lavras (MG) e pós-doutor pela Universidade de Nebraska-EUA, Lincoln, em Engenharia de Irrigação e Manejo de Água. Atualmente é pesquisador na área de recursos hídricos e irrigação e chefe adjunto de pesquisa e desenvolvimento da Embrapa Cerrados. “O Estado pode irrigar mais de 600 mil hectares, independente de qualquer coisa”, disse ele.
Lineu visitou o Estado na última segunda-feira (18), quando participou da apresentação ao governador em exercício Ricardo Ferraço do Polo de Agricultura Irrigada do Extremo Norte do Espírito Santo, ao lado da diretora do Departamento de Irrigação do Ministério da Integração, Larissa Rego, e da coordenadora Stefanie Botelho, e participa do grupo de trabalho que prepara a visita técnica e a oficina de lançamento do polo em Pinheiros nos dias 25 e 26 de outubro.
O MAIS IRRIGADO
O Espírito Santo é, possivelmente, o Estado mais irrigado do País, na avaliação do presidente da Associação dos Irrigantes (Assipes), Thiago Orletti, que considera o município de Pinheiros, no Extremo Norte, “o mais irrigado do País”. Segundo ele, na região Noroeste é impossível ter produção agrícola sem irrigação. Se o Estado explorar todo o seu potencial, a partir dos incentivos da criação do polo, poderá chegar perto de 1 milhão de hectares irrigados.
De acordo com as informações da Agência Nacional de Águas (ANA), no Espírito Santo há 260,613 mil hectares irrigados, sendo que 220,243 mil hectares irrigados na área da Sudene do Estado, representando 84% da cobertura estadual em 2019. A área irrigada do Espírito Santo corresponde a 3% da área total irrigada no Brasil, apesar de o território do Estado representar apenas 0,54% da área total do País.
Nas condições atuais, a ANA projeta que o Espírito Santo terá, em 2040, 405,414 mil hectares irrigados, sendo 336,797 mil hectares irrigados na área da Sudene do Espírito Santo, representando 83 % da cobertura estadual em 2040. Ou seja, a projeção de crescimento da irrigação no Estado é de 55,5% nas próximas duas décadas, e de 52,9% na região da Sudene, composta por 31 municípios.
HISTÓRICO
Em 24 de abril de 1968, com o título “Escassez Alimentar no Brasil”, o jornal O Estado de São Paulo informou que o Brasil precisaria multiplicar por 10 a sua produção de alimentos, “ou será forçado a parar o surto de industrialização por falta de divisas para pagar o crescente volume de importação de comida”.

Em palestra comemorativa ao Dia Nacional da Agricultura Irrigada, em 15 de junho deste ano, o pesquisador Lineu Neiva Rodrigues demonstrou que hoje o Brasil é o maior produtor de alimentos do mundo, com 270 milhões de toneladas de grãos, 25 milhões de toneladas de carne bovina e 41 milhões de toneladas de frutas, sendo o 3º maior exportador de alimentos com volume de US$ 76 milhões, mas o maior exportador de carne, café, açúcar, suco de laranja e aves.
Ou seja, o Brasil superou as previsões sombrias de cinco décadas atrás. “A produção de alimentos representa 28% do PIB nacional, 37% da mão de obra empregada e 42% de nossas exportações. De 1970 até hoje, a população brasileira cresceu em torno de 110% (de 90 milhões para 210 milhões de pessoas em cinco décadas). A área plantada cresceu apenas 20% e a produção de alimentos aumentou 257%”, relatou Lineu.
Em função disso, há um dado pouco conhecido e trazido a público pelo pesquisador da Embrapa, especialista em irrigação: o preço da cesta básica. “Quando analisamos o custo da cesta básica, o brasileiro hoje come 76% mais barato do que se comia em 1970”, acentuou.
Para Lineu Neiva, isso é um grande diferencial estratégico e ocorre graças á tecnologia, “e dentro dela eu não tenho dúvidas de que está a irrigação”, agora avançando para a fertirrigação que é a conjugação da irrigação com fertilizantes adicionados à água.
SEGURANÇA ALIMENTAR
O ODS2 (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) determinado pela Organização das Nações Unidas (ONU) é o fim de todas as formas de fome e desnutrição como desafio global até 2030, especialmente aquela que afeta a infância, destacando a importância da agricultura sustentável.
A Unesco, que é o setor das Nações Unidas que cuida do tema agricultura e alimentação, afirma haver situações paradoxais no mundo, citando que, como exemplo disso, nos últimos anos aumentou a fome de forma paralela com outras formas de má nutrição, como é o caso da obesidade.
Conceito nascido na década de 70, a segurança alimentar teve sua abordagem evoluindo nas últimas cinco décadas, incluindo diferentes variáveis econômicas e socioculturais. A Conferência Mundial de Alimentação (CMA) Roma 1996 definiu que “segurança alimentar ocorre quando todas as pessoas têm acesso físico, social e econômico permanente a alimentos seguros, nutritivos e em qualidade suficiente” para satisfazer suas necessidades nutricionais e preferências alimentares, tendo assim uma vida ativa e saudável.
Essa segurança alimentar, enfatiza Lineu Neiva, está vinculada com a segurança hídrica, sendo “a falta de alimentos e a disputa pela água as causas dos principais conflitos globais”.
De acordo com os números apresentados pelo pesquisador da Embrapa, o mundo hoje irriga 340 milhões de hectares, sendo que a China responde por 20,3% dessa área, a Índia com 19,6%, os Estados Unidos com 7,8% e o Brasil com apenas 1,6%, mesmo fornecendo alimentos, estimadamente, para 1 bilhão de pessoas no planeta.
“A área irrigada no Brasil corresponde a apenas 7,8% do que a China irriga, sendo que a China é somente 11% maior do que o Brasil , com muitas áreas inóspitas. O Brasil irriga 8,5 milhões de hectares de uma área irrigável de 65 milhões e pode chegar a 55 milhões de hectares sem comprometer a sustentabilidade, sem comprometer o meio ambiente”, afirma Lineu. Ou seja, o Brasil irriga apenas 3% da área plantada e tem potencial para irrigar 13%.
“Somos líderes na agricultura dos trópicos e um dos poucos países do mundo com capacidade de aumentar sua produção de alimentos de forma sustentável”, enfatiza.
*José Caldas da Costa é jornalista, geógrafo e diretor da Tribuna Norte-Leste
Crédito da foto da capa: FAO/Arete/Ismail Taxta
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