No momento em que – escudados no incômodo, anômalo e antirrepublicano silêncio do candidato derrotado, o presidente da República Jair Bolsonaro (PL), que não se dignou a reconhecer o resultado das urnas e imita o insano norte-americano Donald Trump – militantes de extrema direita tentam atrapalhar a vida do País, bloqueando vias em protesto contra a vitória do candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o portal Tribuna Norte Leste vai ao encontro de especialistas com uma pergunta objetiva:
Quem venceu as eleições de domingo? A esquerda ou o centro democrático?
De um modo geral, as opiniões convergem numa mesma direção para atribuir à capacidade de Lula de aglutinar forças em torno de seu nome e de seu projeto de governo o principal fator para sua apertada vitória por diferença de apenas 1,8% num colégio eleitoral de mais de 150 milhões de eleitores – a maior democracia do hemisfério sul.
Fernando Carlos Dilen, advogado especialista em direito eleitoral👇
“Acho que Bolsonaro, no País, e Manato, no Estado, conseguiram fazer existir uma direita que sempre esteve camuflada no Brasil por muitos anos. Não vou dizer que quem venceu foi o centro-democrático, porque a democracia sempre vence, mas desta vez quem venceu foi a esquerda mesmo”.
Fernando Carrero, jornalista, especialista em marketing político👇
“Quem ganhou a eleição foi o antibolsonarismo, assim como quem ganhou a eleição em 2018 foi o antipetismo. Vivemos tempos de polarização extrema. Ora o pêndulo meneia para a diretia, ora para a esquerda. Com o Brasil dividido da forma como está, antevejo tempos de mais acirramento político e mais ondas cíclicas como essa”.
Lucas Margoto, analista político👇
“Lula ganhou a eleição porque teve sabedoria e compreendeu pragmaticamente a realidade: o antipetismo ainda é muito forte no País, mas ele (Lula) é maior que o PT. Fez acenos ao centro político desde o início ao viabilizar o arranjo que levou Alckmin à sua chapa, buscou interlocutores junto aos industriais, banqueiros e o agronegócio. No segundo turno teve humildade para pedir apoios certeiros: Simone Tebet, parcelas do MDB e do PSDB foram se juntando ao projeto, o que acabou sinalizando que o Lula de 2022 é outro, menos vermelho e mais verde-amarelo”.
Álvaro José Silva, jornalista👇
“No meu caso, quem ganhou a eleição foi a frente ampla que pode ser chamada de Centro Democrático e que abriu o leque de propostas e de público votante a partir da entrada em cena de Simone Tebet. Isso foi vital para a conquista de votos decisivos de centro. Uma parcela grande dos eleitores do chamado centro político estava desanimada com Bolsonaro. Vai daí, venceu a resistência que tinha ao PT e votou contra o atual presidente”.
João Gualberto, cientista político👇
“A instituição da eleição em dois turnos, que no Brasil começou depois da Constitutiçao de 1988, tem como finalidade permitir que se façam essas coalizões. Na França, as eleições proporcionais são também em dois turnos. Como a eleição é distrital, os dois deputados mais votados do distrito vão para o segundo turno. Aí acontece uma coisa interessante, porque colocam coalizões à direita e coalizões à esquerda. Então, os que saem do processo eleitoral saem com definições mais claras. Todos as ok vezes em que promove esse processo conceitualmente, está tentando produzir coalizões. Então, toda eleição em dois turnos tende a ampliar essas bases. A partir de 2018, organizou-se uma direita mais forte e o próprio governador ampliou seu leque. No caso nacional, o processo é o mesmo. O PT não venceu no primeiro turno, mas foi o mais votado. Foram para o segundo turno, e venceram por 2 milhões de votos num eleitorado muito amplo. As apurações já estavam próximas do fim e ainda haviam dúvidas de quem venceria. Lula, na passagem do primeiro para o segundo turno incorporou a Simone Tebet de maneira muito forte, a Marina Silva também muito forte, o Alckmin ampliou seu papel em São Paulo e o Lula que sai das eleições de 2022 é um Lula muito mais amplo e plural do que aquele que venceria a eleição se fosse somente primeiro turno. Tanto Lula quanto Casagrande ampliarão suas bases de sustentação na sociedade. São menos partidários e mais plurais”.
Luiz Trevisan, jornalista político👇
“Tanto o poder de mobilização petista quanto o apoio do centro democrático foram preponderantes para o Lula enfrentar as forças bolsonaristas e o rolo compressor da máquina oficial. Foi uma união inédita e oportuna contra o retrocesso representado por um governo dissociados da ciência e pautado por uma economia sem inclusão social”.
Hélio Maldonado Júnior, advogado especialista em direito eleitoral👇
“Quem venceu as eleições foi o antiautoristarismo. Bolsonaro, líder da extrema direita no Brasil, ao curso do seu mandato, praticou atos sistemáticos e contínuos contra as Instituições, criando uma narrativa vencedora aos olhos de seus seguidores: a crise do Judiciário, da mídia, e de seus adversários políticos. O modo para essa operação foi a criação de inimigos artificiais: a liberdade de expressão cerceada pela Justiça, a parcialidade dos meios de comunicação contra deu Governo, e a implementação do comunismo por seus desafetos. Assim, praticou Bolsonaro atitudes típicas de como morrem as democracias no mundo contemporâneo. Isso acabou por aglutinar em si um alvo contra o autoritarismo, levando pessoas e partidos de diversas ideologias e seguimentos advogar contra a campanha de Bolsonaro, mas todos a favor da continuidade e retomada da estabilidade do regime democrático no Brasil”.
Darlan Campos, cientista político👇
“Uma eleição nunca tem apenas um ganhador. Ainda mais uma eleição difícil como esta. O primeiro, inegável, é o Lula, com sua história pessoal, passando por todos os fatos – eleito em 2002, reeleito em 2006, faz sucessor duas vezes, depois é preso, tem processos anulados pelo STF, volta à cena política, vence um Presidente em mandato em disputa da reeleição, algo inédito. Então, Lula é um grande vencedor nesse processo. Uma característica dessa dimensão é que a baixa diferença de votos do Lula, pouco mais de 2 milhões de votos, não seria possível sem uma ampliação do leque de alianças do PT. Então, isso foi um aspecto fundamental. Começando primeiro por trazer Geraldo Alckmin como vice, depois abrindo o leque com mais de dez partidos em sua coligação, depois os apoios que se achegaram no segundo turno – Marina Silva, Simone Tebet, que para mim foi fundamental, outros partidos e outras lideranças que não são petistas mas que nesse segundo turno pediram votos para Lula. Então, é uma eleição onde se tem muitos vitoriosos, e traz um novo retrato do Brasil, um Brasil divido política e socialmente, norte e Sul, ricos e pobres, católicos e evangélicos, idosos e jovens, muitas singularidades dessa eleição histórica”.
Luciano Ceotto, advogado especialista em direito eleitoral👇
“Há muito a dizer, mas já diria que não foi o PT que ganhou eleição, mas a rejeição ao Bolsonarismo. Por outro lado, uma vitória de um 1,8% não aponta para um arrefecimento da polarização no país. Isso revela um problema estrutural de nossa política. O sistema de eleição majoritária estimula que 50% do eleitorado, ou até mais, se considerarmos as abstenções brancos e nulos, não tenha seus votos considerados na formação do governo. Do meu ponto de vista, o sistema federativo é desequilibrado na medida que concentra competências e Poderes da União enquanto que o mais adequado seria descentralização para estados e municípios. O modelo exitoso de descentralização foi a gestão da COVID. Ainda que por meios errados, ou seja, por decisão do STF, corretamente os governadores foram empoderados para tratar das questões de saúde conforme as peculiaridades de cada uma das unidades federadas”.
Edivaldo Euzébio dos Anjos (Tinoco dos Anjos), jornalista👇
“Vitória do Lula foi resultado de uma ampliação politica que ele fez. Entendeu que o PT sozinho não poderia derrotar um presidente candidato à releeição, que usou a máquina descaradamente. Lula ampliou para o centro democrático, entendendo que é preciso dialogar com esse setor, com a direita democrática e conservadores que não são fascistas. Ele começou isso a partir da escolha do vice, Geraldo Alckmin, que foi uma coisa inusitada. Somente uma articulação poderosa dessa poderia derrotar o desrespeito à legislação eleitoral praticada pelo Presidente candidato à releeição. A tentativa de compra de voto foi rechaçada. O uso da máquina depende da confiança em quem a comanda. Claro que a derrota do Bolsonaro não acaba com o bolsonarismo, mas enfraquece. A esquerda e os democratas têm a oportunidade de recuperar o apoio da população brasileira. O desempenho da Simone Tebet no segundo turno foi um exemplo para o Ciro Gomes nunca mais fazer a loucura que fez, com seu narcisismo. Simone foi a grande estrela. Concordo que a articulação da esquerda com o centro democrático foi a grande responsável pela vitória histórica”.
Josué King Ferreira, mestre em Sociologia👇
“Depois de um período com o Brasil quase mergulhando no extremismo sem fim, com o pé quase atolando no fascismo e um obscurantismo sem tamanho, retornamos novamente para o processo democrático, com eleições limpas e com urnas confiáveis, com as instituições que muitos achavam, que não funcionariam. Pensei muito no Best Seller “Como as democracias Morrem” (Steven Levitsky e Daniel Ziblatt),
Numa eleição concorrida ao extremo com dois candidatos, a polarização exacerbada, debates acalorados, o uso da fé, dos púlpitos como nunca se viu, a discussão do bem e do mal, ou seja o pensamento maniqueísta, surgiu a grande idéia: juntar uma federação dos partidos do campo progressista numa frente única. Um processo que durou alguns meses e protagonizado pelo Partido dos Trabalhadores, mas, com um objetivo único: derrotar o negacionismo, a misoginia, o preconceito racial a homofobia, e dar esperança a toda população vulnerável no nosso pais.
Portanto, não foi o Partido dos Trabalhadores (PT), que ganhou as eleições. Ganhou a Democracia, o centro democrático e ganhou o Brasil. Por tabela, recuperamos nossa bandeira e também a camisa de nossa seleção. Ganhou o povo brasileiro e “a pátria de chuteiras” como escreveu nosso grande cronista Nelson Rodrigues”.
Erly Euzébio dos Anjos, Doutor em Sociologia👇
“O grande vencedor é mesmo Lula, que orquestrou uma frente ampla. Também achava que ele estava morto politicamente quando foi preso, mas, a exemplo de Mandela, ele se fortaleceu na prisão e buscou uma estratégia sábia na teoria e, na prática, e elas foram cruciais para amenizar o real conflito entre esquerda e direita que ainda restam. Porém, ele foi o grande ator que baixou o facho de um petismo radical e dialogou com forças da direita mais mansas com Alckmin e Tebet. Há um fator que diz respeito à ameaça que negros e pobres podem desencadear nos que têm posses e privilégios na sociedade. O conceito na Sociologia que se denomina ‘as classes perigosas’ precisa ser resgatado. Foi contra este medo que praticamente metade do eleitorado votou em Bolsonaro e Manato. Os que surtam com a derrota têm certeza que as classes perigosas vão tomar-lhes o que têm mesmo. Podem parecem irracionais, mas não são”.
(Da Redação com José Caldas da Costa)
Comente este post