Eu vivo da esperança de que um dia ainda volto para Portugal. É uma terra antiga como antiga é toda a terra do nosso planeta, mas sua exploração ininterrupta por vários milênios faz crer que, além de antiga, aquela terra é velha, está envelhecida e cansada. Não que eu não goste do nosso Brasil – este Brasil de agora, pintado de verde e amarelo com leite condensado vazando pelo ladrão -, eu gosto muito, apesar de não entender tanta hipocrisia e roubalheira.
Agora estou vivendo no interior do Espírito Santo, bem na divisa com Minas Gerais, numa cidade que me acolheu ainda ‘puto’ e para onde volto, de tempos em tempos. Antes disso vivi em vários outros locais, no verdadeiro interior de Minas Gerais, na capital capixaba, mas quando lembro de Portugal, a saudade ainda mais cresce e me divide entre o ser patriótico e o exótico, o endógeno e o exógeno que em mim habitam.
Passeio pela estrada de Cachoeirinha do Itaúnas, onde um alegre e simpático cãozinho me espera todos os dias na madrugada, ainda antes do sol nascer, para receber um carinho, uma fala gentil. Deixa-se afagar sem um latido, tenta lamber-me a face e depois que o coloco de novo no chão, volta feliz para o quintal, sem mais delongas.
Aqui até os bois mugem diferente de outrora, embora continuem a morrer pela nossa causa. Há um passaredo alegre chamando por nós todas as manhãs: sabiás, canários, japus e outros canoros sobrevivem nas matas e saúdam o amanhecer.
Eu vivi da esperança de que isto tudo existisse também por lá, mas essa esperança é miúda, apenas um desejo sincero e impossível. Lá ouvia cantar apenas o melro, que, para me agradar, tentava imitar uma sabiá. Demais disso, só canários belgas e pardais e os “barriga-de-lata”, faziam barulho musical.
Por lá, agora, é tempo de crise, crise de saúde. A pandemia pegou pesado com a malta ibérica e os hospitais estão em situação de calamidade.
Os patrícios estão murchos, cabisbaixos e, como sempre, diaspóricos (inventei a palavra agora), buscando não mais o norte, mas o sul e o leste, o caminho onde há 500 anos vieram buscar as riquezas que não têm mais.
Mesmo assim, com a pecha de colonizado, eu continuo a gostar muito de lá, dos amigos tugas, da maneira engraçada como eles falam a nossa língua (que era deles, mas também perderam para nós, por sermos muitos mais os falantes).
Eu vejo aqui cidades tão parecidas com as aldeias portuguesas que, não fosse por algumas diferenças culturais e econômicas, diria que dava para viver o resto da vida aqui, comendo queijo minas feito no córrego do Ouro ou no Vargem Alegre e bebendo pinga da boa, sem mais saudades dos vinhos.
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