* José Caldas da Costa
O conjunto habitacional Ourimar repete um pouco da história de Feu Rosa e, coincidentemente, ambos estão no município de Serra.
Feu Rosa foi ocupado pelos moradores retirados de Alto Maruípe (Morro do Macaco), após a tragédia de 1985, quando houve um deslizamento de pedra que matou mais de 20 pessoas e deixou centenas de desabrigados.
Ourimar é um conjunto residencial construído em parceria com a Prefeitura da Serra, no Programa Minha Casa, Minha Vida, do Governo Federal, operado pela Caixa. Foi entregue em 2016 e abrigou 608 famílias, boa parte delas dependiam de aluguel social, com suas casas interditadas nas chuvas de 2013.
O jornal A Gazeta fez uma cronologia da “ocupação” do condomínio pelo crime. Em 2017, um grupo criminoso expulsou 48 famílias, depois que transformou o condomínio em ponto de traficantes, submetendo os moradores a regras, ameaças e venda de drogas.
Em 3 de junho, uma das principais lideranças do tráfico do local, Marcos Antonio da Silva Xavier, com o sugestivo apelido de “Mata Rindo”, foi assassinado. Antes dele, em 17 de maio, outro traficante, Vander Luiz Guimarães, também foi morto. Era a guerra.
Naquele ano caótico, mais mortes: em 26 de junho, Milena de Oliveira Miguel, que havia sido proibida de entrar no condomínio e entrou; em 29 de junho, Eduardo Barreto Pires.
O segundo semestre de 2017 foi tenso no Ourimar, com muitas prisões feitas pela Polícia Civil, mas as mortes e o terror continuaram naquele ano e nos seguintes. O conjunto residencial virou uma terra do caos.
Inevitável, para quem conhece um pouco da história recente do crescimento urbano desordenado do Brasil, observar os casos de Feu Rosa e Ourimar sem recordar o emblemático caso da Cidade de Deus, no Rio de Janeiro, retratado no filme homônimo que denuncia a desigualdade social, a violência, a ausência do Estado e a marginalização das favelas brasileiras.
Cidade de Deus surgiu nos anos 60 como um projeto de conjunto habitacional, na Zona Oeste do Rio, para abrigar moradores retirados de favelas na região da Lagoa Rodrigo de Freitas. Uma espécie de assepsia social iniciada no Governo de Carlos Lacerda e que se transformou num dos lugares mais violentos do Brasil.
Olhando ao redor, vamos ver problemas muito parecidos em Vitória, Cariacica e Vila Velha, que mereceriam estudos de caso por alguém interessado nas nossas grandes questões sociais: Grande São Pedro (Vitória), Grande Terra Vermelha (Vila Velha) e Fazenda Itanhenga (Cariacica), por exemplo.
Casos como esses e, objetivamente, Cidade de Deus, Feu Rosa e Ourimar nascem do mesmo caos social provocado pelo êxodo de populações rurais para as regiões urbanas como projetos de Governo em eras não muito remotas.
*José Caldas da Costa é jornalista, escritor e geógrafo.
Foto em destaque: Fábio Nunes/A Tribuna-ES
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